Economia criativa avança mesmo durante a recessão

O Globo

RIO — Em um ano em que os brasileiros viram a economia encolher e a inflação decolar, um setor está conseguindo dar um olé na crise. É a chamada economia criativa, que engloba tanto a indústria cultural como design e moda, passando por games, publicidade, inovação e desenvolvimento de novas tecnologias. Neste segmento, financiamento, produções e número de empresas estão em expansão. Isso se explica, basicamente, pelo fato de que, em meio a uma conjuntura que comprometeu a confiança do investidor e travou a atividade econômica, a economia criativa oferece uma resposta rápida e eficaz às adversidades, explicam especialistas.
— Considerando o que observamos na crise de 2008/2009, a indústria criativa tende a avançar com ainda mais intensidade em períodos de turbulência. Numa conjuntura macroeconômica nublada, para as companhias seguirem em frente, elas precisam inovar. Na crise, os recursos se tornam mais raros e escassos. Os profissionais criativos são uma alternativa à inovação tecnológica para produzir melhor, mais rápido e com qualidade, tanto produtos quanto serviços — explica Gabriel Pinto, coordenador do programa de Indústria Criativa do Sistema Firjan.
EM DEZ ANOS, EXPANSÃO DE QUASE 70%
Marcos André Carvalho, diretor da Incubadora Rio Criativo, da Secretaria de Estado de Cultura, inclui no conceito de economia criativa arquitetura, design, moda, gastronomia, turismo cultural, indústria do entretenimento, games e publicidade, com suas cadeias produtivas. Uma das empresas que teve apoio do órgão foi a Dumativa, de jogos eletrônicos.
— De acordo com a Unctad (órgão da ONU), estes são os setores que hoje em dia mais crescem e geram emprego no mundo. Foram os únicos setores que continuaram crescendo na crise mundial de 2008 — ressalta Carvalho. — A cultura é hoje o fermento do bolo, não mais a cereja.
Se em 2015 o Produto Interno Bruto (PIB) deve ter sofrido queda de 3,7%, com a inflação atingindo 10,7%, analistas estimam que a economia criativa está surfando no maremoto econômico. O PIB da indústria criativa brasileira chegou a R$ 126 bilhões no fim de 2013, ou o equivalente a 2,6% do total produzido no país naquele ano. Representa avanço de 69,8% em dez anos, acima dos 36,4% registrados pelo PIB nacional no mesmo período, mostra pesquisa da Firjan do fim de 2014. Não há dados mais recentes, mas especialistas afirmam que essa tendência se mantém.
Empresas e especialistas comemoram a oferta maior de financiamento, mas alertam que a sustentabilidade não está garantida. Até mesmo iniciativas bem-sucedidas continuam a depender da captação de recursos.
O BNDES respondeu por R$ 3,18 bilhões em desembolsos para a economia criativa entre 1997 e 2014 — quando somaram R$ 940 milhões —, sendo R$ 2,23 bilhões de forma direta, explica Luciane Gorgulho, chefe do Departamento de Economia da Cultura do BNDES.
— Faltam ações para os primeiros estágios do negócio, quando são semente ou start-up. Estes pedem soluções financeiras como patrocínio, prêmios, microcrédito e mesmo crowdfunding — diz Luciane.
Os números impressionam. Mas há um entrave ao desenvolvimento da economia criativa: falta uma definição sobre o que é, o que abrange e quanto movimenta o setor no Brasil, a fim de balizar políticas públicas. O Ministério da Cultura (MinC) comanda os projetos do governo federal para o que chama de economia da cultura. Ele trabalha com um universo de cerca de 400 mil empresas atuando no segmento (7,8% do total no país), gerando mais de dois milhões de empregos.
— Precisamos medir o impacto econômico da economia da cultura. Uma das ações com este foco é o Observatório da Economia Criativa. Vamos criar a Conta Satélite da Cultura, que vai ajudar a ter uma mensuração sólida, com séries históricas. Deve estar em pleno funcionamento até 2018 — diz Gustavo Vidigal, coordenador-geral de ações empreendedoras da Secretaria de Políticas Culturais do MinC.
A Conta Satélite, uma parceria com o IBGE, vai medir o impacto da cultura no PIB e mapear a cadeia do setor. Assim, diz Vidigal, será possível estabelecer prioridades na elaboração de políticas públicas. Segundo ele, para este ano o MinC trabalha com projetos nas áreas de games, animação e patrimônio.
Luciane, do BNDES, defende novos formatos e modelos de financiamento:
— O audiovisual se destacou por contar com bons instrumentos de financiamento e uma política pública específica. Há áreas ainda carentes de ferramentas de fomento. Em patrimônio cultural, por exemplo, a sustentabilidade de instituições sem fins lucrativos é debate urgente.
GAMES NO CENTRO DAS ATENÇÕES
A expansão do audiovisual ocorreu sobretudo após a lei 12.485/2011, a Lei da TV Paga, que instituiu uma cota de produções nacionais para os canais fechados. Além disso, surgiram a Agência Nacional do Cinema (Ancine) e o Fundo Setorial do Audiovisual.
As atenções, agora, voltam-se para os jogos eletrônicos. O BNDES discute com o governo a criação de políticas públicas para estimular a produção de games, diz Luciane, e o MinC espera ter, ainda este ano, programas de financiamentos para o setor — que emprega profissionais como designers e animadores e que traz inovação tecnológica.
Em 2014, um estudo encomendado à Fundação de Apoio à Pesquisa da USP levantou informações sobre essa indústria no Brasil e no exterior. No mundo, segundo pesquisa da consultoria PwC, o mercado de games movimentou US$ 65,7 bilhões em 2013, devendo chegar a US$ 89 bilhões em 2018, um crescimento médio de 6,3% ao ano. No mesmo período, a previsão para esse mercado no Brasil é de expansão de 13,5% ao ano, saltando de US$ 448 milhões para US$ 844 milhões.
Das 133 empresas do segmento no Brasil, 74,4% faturam até R$ 240 mil por ano, a maior parte tem até cinco anos de vida e apenas 8,5 funcionários. Mais de dois terços utilizam recursos próprios, da família ou de outros indivíduos. Ou seja, as empresas não estão adequadamente estruturadas, têm pouca expressão internacional, são jovens e com baixas taxa de crescimento e de expectativa de vida — um desafio a ser enfrentado.
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