Gestão e captação em OS de cultura

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Aconteceu na manhã desta quarta-feira (25/11), no Museu do Futebol, em São Paulo (SP), o Seminário Organização Social de Cultura, uma iniciativa do Cultura e Mercado com a ABCR – Associação Brasileira de Captadores de Recursos.
Foto:  Dean HochmanA proposta foi debater a gestão e a captação de recursos nesse modelo de organização, criada a partir de experiências inglesa, australiana e neozelandesa, de uma nova maneira do Estado aplicar políticas públicas, como explicou Fausto Arruda, superintendente geral da Fundação OSESP, convidado da primeira mesa. “A ideia era ter uma mudança de paradigma na administração. O Estado tentando olhar para a execução da política pública de uma maneira menos rígida e mais focada no atendimento e na qualidade do serviço.”
Ele lembrou que, na prática, o administrador público tem pouca liberdade e espaço para exercitar a criatividade, porque só pode fazer o que a lei permite. No mercado, pode-se fazer tudo o que a lei não veda. As OS ficam no meio termo entre o público e o privado.
A Osesp foi criada em 1954, por lei, e viveu dentro da estrutura do Estado até 2005. Em 1997, foi reformulada, com a criação da Sala São Paulo e novos investimentos na orquestra. Foi um momento em que as instituições culturais ligadas ao Estado, segundo Arruda, viviam em situações precárias de contratação. “Isso chegou num esgotamento e o Ministério Público interferiu, indicando fazer concurso público ou adotar outro modelo. O Estado, então, decidiu implementar o sistema de OS.”
Contratação de músicos e serviços específicos, viagens e gravação de CDs eram algumas das questões a serem melhoradas. A lei das licitações não cobria a contratação da iluminação de espetáculos, por exemplo, que muitas vezes não segue a lógica do orçamento mais barato, mas sim do serviço de melhor qualidade. Outra questão é que as receitas operacionais, antes não iam para a instituição – dinheiro da bilheteria, por exemplo, ia para um fundo e não necessariamente voltava para quem o gerou.
“No modelo de OS, os recursos do Estado chegam via contrato de gestão, recursos das leis de incentivo vão direto para a organização e as receitas de serviços são consolidadas na gestão, com responsabilidades definidas, prestação de contas para órgãos públicos e auditoria externa. Contratos de trabalho são via CLT, não concurso público, e os salários são de mercado. Assim, implementa-se uma cultura voltada a resultados, com metas quantitativas e qualitativas”, explicou o representante da Fundação Osesp.
Ele também contou que são feitas pesquisas de satisfação de tempos em tempos para a grande maioria das atividades, já que o objetivo final é a satisfação do público. “Na Osesp tivemos uma acessibilidade maior. Ao longo dos anos, temos aumento dos programas educacionais, criação de concertos matinais gratuitos e a preços populares, concertos ao ar livre – 60% do público não paga -, permeabilidade e entrega de atividades no interior e litoral do Estado. São diretrizes de política publica executadas pela instituição”, contou. Para ele, modelos alternativos e que não impliquem na execução direta da política pública pelo Estado podem atingir melhor as finalidades definidas.
“Está havendo uma desmistificação na prática das OS. Num primeiro momento, houve um embate ideológico muito grande.  O questionamento do modelo foi feito antes mesmo de saber se ele funcionava. Lógico que ele tem que ser aprimorado e fiscalizado sempre, mas sinto que o ranço ideológico está acabando. Estamos vendo experiências que dão certo e outras que não dão. São diversos modelos que vão surgindo e amadurecendo, e ao longo do tempo conseguimos avaliar com menos ideologia e mais pragmatismo o que funciona e o que não funciona”, defendeu.
Luiz Laurent Bloch, diretor executivo do Museu do Futebol, disse que, em conjunto com o Museu da Língua Portuguesa – ambos gerenciados pela IDBrasil Cultura, Educação e Esporte – a instituição recebeu mais de 800 mil visitantes, o que prova que são modelos de sucesso. “Nossos dois museus estão entre os top 10 da América do Sul. Não consigo entender como não tem fila de pessoas querendo participar disso. Por que é tão difícil a captação?”, questionou.
Oitenta porcento dos recursos do Museu do Futebol vêm do contrato de gestão com o governo do Estado. Os 20% restantes são de captação, bilheteria e aluguel de espaço para eventos. Os captadores entram com projetos da Lei Rouanet e patrocínio direto. Ainda assim, conseguir apoiadores tendo em vista que é um museu de experiência, com exposições permanentes, é um desafio.
No entanto, diferentemente de outros projetos que estão à disposição no mercado para serem apresentados a empresas, aqueles que estão ancorados por uma OS têm alguns benefícios, lembrou Claudia Taddei, conselheira do Instituto Pensarte. Um deles é a segurança para o patrocinador. “A instituição tem uma relação contratual com o governo, que responde a uma série de quesitos de transparência, e também já custeia uma equipe que é importante para manter uma qualidade. Os recursos mínimos necessários já estão garantidos e o patrocinador vem ajudar a melhorar essa composição”, explicou.
O Pensarte faz captação pessoa física através de seu programa de assinatura e conseguiu, nos últimos anos, dobrar sua receita com isso. Um dos desafios, contou Claudia, é reativar a rede de associados e criar uma relação com pessoas físicas, não só para contribuição financeira, mas também na função social de pensar e fazer cultura. “Manter um diálogo aberto com a sociedade em geral é a forma como estamos pensando a relação com pessoas físicas, mas ainda não estamos pensando em um espaço para doação direta.”
A Fundação Osesp criou um fundo de capital para ajudar no custeio da instituição em momentos de crise, para realizar um projeto especial ou cobrir aspectos não previstos no contrato de gestão. Tudo exclusivo para atividades da orquestra e da Sala São Paulo. Hoje o fundo conta com R$ 45 milhões (em recursos captados fora do poder público), mas Arruda lembrou que as atividades da Fundação custam R$ 100 milhões por ano. Não vem de recurso público. “A ideia é que com o rendimento a gente possa custear parte das atividades e não ter um impacto tão grande em momentos econômicos como o que vivemos hoje, em que o repasse de recursos do governo fica menor. Porque no fim, quem sofre é a população, que tem menos atividades entregues.”
Segundo Arruda, tenta-se fazer uma gestão que consiga suavizar esses ciclos, e diversificar a captação desses recursos, com pessoas físicas e aluguel de salas, por exemplo. Hoje a projeção é que 45% dos recursos seja do governo, e cerca de 55% venha de captação e receita operacional. Há uma equipe interna de 3 a 4 pessoas trabalhando apenas para a captação. E apesar de não haver uma cultura de doação de pessoas físicas no Brasil, o programa da Fundação Osesp mostra que se tentar é possível ter resultados. “Em 2005 tínhamos menos de 100 doadores. Hoje são mais de 400 doadores e a projeção é de quase um milhão de reais captados em 2015″, calculou.
Planejar para captar – “Visitantes são potenciais doadores e precisam conhecer não apenas o museu que estão visitando, mas também as instituições que estão por trás disso”, defendeu João Paulo Vergueiro, diretor executivo da ABCR, na abertura da segunda mesa do evento. “A liderança da instituição precisa acreditar na importância da captação de recursos e também é necessário o valor interno de que toda a equipe é responsável pela captação. Quem atende o telefone representa isso”, disse.
A captadora Daniele Torres, da Companhia da Cultura, concordou: “Não importa o grau de participação no projeto em si, nível hierárquico ou sociocultural. Todos fazem parte do processo de captação e muitas vezes as melhores ideias vêm das pessoas que não estão na ponta da captação.”
Para ela, o trabalho de captação de recursos tem a ver com o desenvolvimento de relações institucionais. Nesse sentido, ter um departamento interno que cuide disso traz credibilidade. “O trabalho de captação perpassa por diversas áreas da instituição. É uma mola, impulsionador e receptor de tudo o que acontece. Não estou dizendo que captador externo não funcione, mas a instituição ter seu próprio departamento permite que o captador conheça profundamente a instituição, tenha contato direto com a comunicação, fazendo demandas específicas, e consiga negociar com mais facilidade”, explicou.
Além disso, a inserção do planejamento da captação dentro do planejamento estratégico ajuda a trazer perenidade às ações. Ao criar vínculos, conquista-se a sustentabilidade. Inclusive com o público, ao vê-lo como potencial doador. Nesse sentido, a diversificação de fontes de recursos volta à pauta. “Estamos muito acostumados a ir atrás do corporativo, das empresas, das leis de incentivo. Funciona, é ótimo, as leis estão aí para isso. Mas se formos pensar em sustentabilidade das organizações, é fundamental pensar no longo prazo, em formas de construir fundos, de gerar renda nos eventos, de captar com pessoas físicas, com associados, com editais, com convênios com o próprio governo. Ampliar a fonte de recursos é fundamental.”
É preciso ter paciência, pois os resultados de montar uma equipe vêm a médio e longo prazo. Mas a via tem mão dupla: o reconhecimento tanto da OS quanto da instituição e a mobilização de recursos impactam e colaboram um com o outro.
A Pinacoteca do Estado de São Paulo mantém um departamento de captação interno, ainda pequeno, que fica dentro da área de relações institucionais. Todos os patrocínios são buscados dentro de um único projeto, que se configura como apoio à causa Pinacoteca, ainda que sua visibilidade se dê em ações e mostras específicas. A responsável pelo setor na instituição, Julia Puglia Bergamasco, explicou que trabalham com Lei Roaunet (em torno de R$ 10 milhões) e Proac (em torno de R$ 1,3 milhão por ano), sendo cinco cotas na área de exposições e três para o educativo.
Sessenta e cinco porcento da verba vem do contrato de gestão com o Estado, para despesas operacionais e algumas exposições permanentes; 5% é bilheteria, loja e locação de espaço para eventos (que a secretaria considera parte do contrato de gestão, para manutenção do prédio); e 30% dos patrocinadores pessoas física e jurídica, que são destinados à programação.
Os 22 parceiros atuais têm contrapartidas como visita guiada exclusiva, cota de catálogos e cessão de espaço. Mas a credibilidade ainda é o ponto forte e de atenção. “Somos o museu mais antigo da cidade e referência como museu de arte brasileira exposta de forma permanente. A credibilidade precisa ser mantida a todo custo e vale em todas as pontas do processo. Por isso, a captação é o único setor que faz relação com todas as outras áreas”, disse Julia, que acompanha pessoalmente todas as ações para os patrocinadores. Para ela, a conscientização e o engajamento da equipe são dos principais desafios. “Todos têm que entender que o patrocinador não é vilão nem mocinho, e quais os pontos negociados para garantir uma boa relação.”
João Paulo Vergueiro defendeu que o indivíduo tem que financiar cultura e que é preciso trazer as pessoas para se entenderem pertencentes a isso. “Um dos pressupostos da captação de recursos é que doador tem causa. Cultura tem que ser causa. Temos 130 milhões de potenciais doadores no Brasil. Quando tivermos mais brasileiros doando, a cultura aparecerá ainda mais como causa”, disse.
Para isso, sugeriu que o modelo ideal de doação seria uma legislação única pra incentivo fiscal, não por área. No momento, ele disse, trabalha-se para voltar com uma antiga legislação, que permite doar para ONG com incentivo fiscal, independente de ter um projeto aprovado no ministério. “Isso facilitaria a captação com indivíduos. Lá fora, o grosso da doação é com indivíduos: 70% a 80% dos recursos são doados pelas pessoas que acreditam na causa. É importante que as OS tenham isso na cabeça.”
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