Com novo órgão, ter São Paulo como cenário de filme deve ficar mais fácil
Carlos Minuano
Colaboração para o UOL

De balcão em balcão atrás de autorizações, produtores audiovisuais precisavam ter muita paciência em São Paulo, uma das cidades mais complicadas do mundo para se filmar. Mas, a vida começou a mudar para eles. Desde o dia 16 de maio, começou a valer de fato o decreto que criou o órgão que promete desburocratizar as gravações na capital paulista, da pré-produção à rodagem.
Com a novidade, as autorizações para rodar um filme, série ou anúncio de TV na capital paulista ficam a cargo da São Paulo Film Commission, departamento da Spcine, empresa paulistana de fomento à criação, produção e distribuição audiovisual. Entre outras mudanças, agora produtores terão que preencher apenas um formulário. E a resposta sairá em até dois dias úteis para filmagens de publicidade e sete dias úteis para demais gravações audiovisuais.
Descomplicar geral é a regra. Por meio de um cadastro único, são informadas as necessidades da produção e dados da empresa solicitante e a São Paulo Film Commission é quem encaminhará os pedidos aos órgãos responsáveis na liberação de ruas, parques e outros espaços para filmagem. Algumas locações terão liberações imediatas. As novas regras darão ainda descontos, de acordo com o tipo de produção –um curta metragem, por exemplo, poderá ter um desconto de até 95% do valor total estabelecido pela locação.

Além de facilitar e dar suporte para o audiovisual na cidade, a film commission pretende atrair os realizadores, diz Alfredo Manevy, diretor-presidente da Spcine. “Muitas paisagens, personagens e narrativas de São Paulo vão ganhar espaço”. A tarefa, segundo ele, não foi nada fácil. “Encontramos uma cidade burocrática, acostumada a dizer ‘não’ ou a cobrar taxas abusivas”.
Isso prejudicou por muito tempo a representação audiovisual da cidade, aponta Manevy. “São Paulo perdeu centenas de filmagens na última década por ser uma cidade quase impossível de filmar. Uma espécie de cidade proibida para o cinema, para o Carnaval, para os artistas de rua, e para a produção cultural no espaço público.
 

Divulgação

Cena de “Ensaio Sobre a Cegueira” (2008), de Fernando Meirelles, rodada no Minhocão


 
‘Poupatempo’ do audiovisual
A coordenadora da São Paulo Film Commission, Tammy Weiss, explica que os trabalhos começaram com um diagnóstico de como era filmar na cidade, consultando diversos órgãos públicos e o próprio mercado audiovisual, e que foram mapeadas as problemáticas enfrentadas pelos produtores e pelo poder público e estudadas films commissions do mundo inteiro.  “Foram seis meses de planejamento até o decreto de filmagem ser aprovado e assinado”. A film commission de São Paulo foi inspirada, segundo ela, nos modelos de cidades como Nova York, Montevidéu, Berlim, Santos e Rio de Janeiro.
Não falta torcida entre os profissionais do setor para que a film commission paulista se torne uma realidade. “Precisa funcionar como um verdadeiro ‘Poupatempo’ do audiovisual de São Paulo”, afirma Paulo Schmidt, da produtora Academia de Filmes e presidente da Abro (Associação Brasileira de Obras Audiovisuais).
O produtor ressalta que nos mercados mais estruturados, as film commissions são as bases de organização para gravações em espaços públicos. Ele cita como exemplo a cidade de Nova York (EUA), sede do principal órgão desse tipo no mundo, que mantém uma média de mais de 3.000 diárias de filmagem por ano (cerca de 80 filmagens por dia). Por lá, as produções são responsáveis por gerar em torno de US$ 8,7 bilhões anualmente, e empregam mais de 100 mil pessoas.
“Isto seria possível em São Paulo”, aposta Schmidt. E os ganhos econômicos não seriam poucos. A produção de um longa-metragem internacional chega a movimentar US$ 250 mil por dia, e a de um comercial de TV, cerca de R$ 1 milhão por semana, segundo estimativas da Association of Film Commissioners International.
“Com um procedimento de autorização mais fácil, o fluxo de filmagens na cidade tende a aumentar, e esse é o maior ganho”, aposta Tammy Weiss, coordenadora da São Paulo Film Commission. De agosto de 2015 a fevereiro deste ano, ainda em fase de estruturação, a film commission de São Paulo atendeu 58 produções –entre séries, programas de TV, videoclipes, publicidade, longas e curtas-metragens.
Dificuldades
Com a produtora Academia de Filmes, Paulo Schmidt já filmou muito em São Paulo, de publicidade a conteúdo de entretenimento, e afirma já ter enfrentado muita dificuldade, principalmente nos cartões postais da metrópole. “No Theatro Municipal precisamos respeitar a programação, e no caso de viaduto do Chá e Minhocão, as filmagens precisam ser viabilizadas à noite ou em fins de semana”.
 

Reprodução

Prédio da FAU-USP em cena de “Que Horas Ela Volta?” (2015)


 
O produtor lembra algumas dificuldades que enfrentou para filmar “Amanhã Nunca Mais”, entre elas fechar o Minhocão por algumas horas para fazer uma cena de tombamento de veículo. “Foi preciso muita articulação com os órgãos municipais à época”.
Ele conta que os entraves já haviam diminuído no fim de 2015, quando filmaram míni documentários em frente ao Theatro Municipal e na avenida Paulista para o projeto #INQUIETACOES_SP. “Já contamos com o apoio da Spcine”, disse. “Mesmo antes do decreto da Film Comission, a filmagem foi facilitada”.
Schmidt afirma que, seja lá onde for, a publicidade é a que mais sofre com a falta de uma film commission eficiente e autônoma. “É uma atividade extremamente ágil e imprevisível, pois se trata de um segmento que pela natureza do negócio não é programado como as obras de conteúdo”. Por questões como essas, as produções em geral fogem para Curitiba, Porto Alegre e outras capitais, quando não saem do Brasil e vão para Buenos Aires, Montevideo ou Santiago.
O produtor espera que além de destravar as amarras para a produção audiovisual, a film commission de São Paulo também consiga atrair parceiros internacionais e torce pela criação de programas de estímulo e incentivo para produções (com isenções de impostos, entre outros), a exemplo do que fazem cidades como Los Angeles, Nova York, Toronto e Mumbai.
Produtores defendem ainda a necessidade de que o decreto seja transformado num projeto de lei, algo que a São Paulo Film Comission afirma que já está nos planos.
Veja a seguir como são os procedimentos para filmar em São Paulo.
 

Reprodução

Cena do filme “Sinfonia da Necrópole” (2016), gravado nos cemitérios do Araçá e da Consolação


 

Entenda como funciona a Film Commission

O Decreto 56.905, que entrou em vigor em 16 de maio, cria um cadastro único, um formulário com todas as informações necessárias sobre a realização da filmagem para facilitar o envio de documentos a todas as entidades envolvidas com a autorização para a gravação.
Prazo
O prazo previsto é de dois dias úteis para filmagens com caráter publicitário e sete dias úteis para as demais, a partir da data do recebimento do pedido encaminhado online pela São Paulo Film Commission.
Custos tabelados
O decreto cria uma tabela de preços para uso de espaços públicos como local de filmagem, com descontos conforme a categoria da produção. Os valores variam R$ 100 e R$ 50 mil, mas será oferecido um desconto específico de acordo com o tipo de projeto. Por exemplo: um curta-metragem independente pode ter um desconto de até 95% do valor total estabelecido pela locação. Filmar em qualquer logradouro público é gratuito e, nas vias, é necessário consultar a CET, que calcula o valor caso a caso, dependendo da ocupação solicitada.
Rede de parceiros
A Spcine concede o selo de ‘empresa amiga do cinema’ a residências, bares, hotéis e outros prestadores de serviços que toparem oferecer descontos para profissionais de sets de filmagem.
Conselho de filmagem
A film comission contará com um colegiado formado por representantes de órgãos da administração pública direta e indireta –secretarias municipais de Cultura, Verde e do Meio Ambiente, Transporte e Finanças, Centro de Engenharia de Tráfego (CET), subprefeituras e SP Turis. No caso da CET, a companhia terá um funcionário dedicado à liberação de filmagens em vias públicas.
Aplicativo
Criação de um programa com banco de dados com informações sobre locações, serviços, mão de obra especializada, comércio, etc.
Qual a burocracia para filmar em um cartão postal como o Theatro Municipal, o Viaduto do Chá ou o Minhocão?
Antes, o produtor enviava a solicitação para as subprefeituras correspondentes ou ao próprio equipamento, como o caso do Theatro Municipal. Com a São Paulo Film Commission, os pedidos serão feitos por meio de sistema eletrônico do novo órgão, que vai centralizar todas as informações da obra audiovisual e do pedido, facilitando o encaminhamento e agilizando a resposta.
Só pode filmar de madrugada?
Depende da locação. Na maioria das vezes é possível filmar em horários variados.
Quanto tempo uma equipe pode fechar uma via para filmar?
Depende da via.
Fonte: Tammy Weiss, coordenadora da São Paulo Film Commission
 
http://cinema.uol.com.br/noticias/redacao/2016/05/31/com-novo-orgao-ter-sao-paulo-como-cenario-de-filme-deve-ficar-mais-facil.htm

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